Há 60 anos, um grupo de pessoas da Comunidade Luterana guardou em uma lata, muito bem acondicionada num baú esculpido em pedra, alguns documentos que estavam no interior da torre principal da antiga Igreja Evangélica Luterana. O que na época foi chamado de “Lançamento da Pedra Angular” não teve data registrada, mas pelas informações contidas nos jornais encontrados, aconteceu entre os dias 1° e 28 de Junho de 1952.
Do grupo que selou os documentos naquela época, apenas dois assistiram a retirada dos mesmos. Trata-se do casal Sônio e Lory Koenig. Ambos não lembravam exatamente o que estava contido no local, visto que muitos anos se passaram. O mistério da torre sempre circulou nas rodas e conversas, muitos diziam que sabiam o que havia no local. Uns falavam em moedas e tesouro, outros em mapas, alguns apenas afirmavam que lá estavam escondidos mistérios do passado. O fato é que o tempo passou, muitos dos que tiveram essa iniciativa já não estão mais entre nós. Alguns mudaram de cidade e outros até esqueceram, situações que contribuíram para instigar ainda mais a imaginação e curiosidade sobre o quê poderia estar lá guardado.
A antiga igreja foi demolida e o que restou foi a belíssima arquitetura da torre, muito firme e bem construída, rica em detalhes, e é claro, com segredos escondidos. O dia 07 de junho, feriado de Corpus Christi, foi a data escolhida pelo atual presidente da comunidade Luterana, Osmaldo Delavy Schroeder, para abertura do local. A convite do mesmo, tive o prazer de registrar, juntamente com um grupo de integrantes da comunidade, a abertura da parede da torre, e confesso que a emoção e a curiosidade tomou conta dos meus pensamentos, e creio que de todos que lá estiveram. Não me contive, e assim como outros, ajudei a romper a parede, nada fácil, diga-se de passagem. A construção foi bem feita e os tijolos firmes dificultaram o trabalho. Todo cuidado era pouco, mas horas depois foi possível visualizar uma lata, situação que só fez aumentar a curiosidade, logo pude colocar a mão no objeto e depois de algumas marteladas a mais, tive a honra de retirar aquele objeto do seu longo descanso, retirá-lo do local que permaneceu por seis décadas.
O mistério da torre se revelou numa fascinante viagem no tempo. Tão logo retirei a lata de dentro do baú de pedra, fiz entregar ao presidente. A emoção era visível aos olhos de todos. Sorrisos e satisfação, mas o que realmente imperava naquele breve instante era a curiosidade. Certamente sentimentos parecidos e vividos por todos os que deixaram no passado aquela lata guardada, protegida, rompendo o tempo, cruzando décadas. Cuidadosamente a lata foi aberta e aos poucos o mistério foi se revelando. O grupo reunido espichava os olhos para ver o que lá estava. Tudo foi registrado, fotografado e filmado. Nada de moedas, nem tesouro, nem mapas. Dentro dela estavam acondicionados dois jornais, duas listas com os nomes dos doadores que contribuíram para a construção da Igreja e um pequeno livro religioso.
Frustração? Nenhuma, eu garanto. Naquele exato momento estávamos dando continuidade à história. Todos nós presenciamos o fechamento de um ciclo, contemplamos e completamos uma parte da história do município. Uma Folha Dominical, da cidade de São Leopoldo, datada de 1º de Junho de 1952, trazia notícias religiosas escritas em português e em alemão. Uma edição do jornal Correio Serrano, de Ijuí, com data de 28 de Junho de 1952, também em português e alemão, fazia parte dos objetos. Entre tantas matérias, uma reportagem agrícola tratava sobre a técnica do plantio do milho e a manutenção correta do solo, já outra trazia notícias de um ataque contra a Coréia do Norte, durante a guerra da Coréia. Um Evangelho Segundo São João tem data de 1930 e foi impresso na Gran-Bretanha. Uma lista assinada a punho e outra datilografada, traz os nomes e valores dos padrinhos e contribuintes que colaboraram para a construção da igreja. A lista datilografada soma Cr 3.260,00 (três mil, duzentos e sessenta cruzeiros, moeda corrente na época).
O que foi encontrado é um imenso legado, uma verdadeira viagem pelo tempo, um registro da história mormacense, de seus cidadãos, seus precursores, de pessoas que deixaram seu nome no tempo, que ajudaram a construir a cidade que hoje conhecemos. A todos eles devemos nosso respeito, reconhecimento e principalmente o compromisso de continuar fazendo e contando a história dessa próspera cidade.
Os documentos encontrados foram arquivados digitalmente e os originais serão acondicionados em local apropriado e posteriormente expostos. Osmaldo Delavy Schoreder, Sônio e Lory Koenig, Jairo Bohrer, Jaqueline da Cruz Trindade e Aurí Bohrer membros da comunidade Luterana estiveram presentes, ainda participaram Patric Cunha Strapazzon e Lucas Eduardo Frainer Silva.
Texto: Patric Strapazzon