Apenas um dia após entrada em vigor da nova Lei de Acesso à Informação, sindicatos de funcionários do Executivo e de magistrados ameaçam recorrer à Justiça por não aceitar determinação da presidenta de publicar vencimentos e “vantagens pecuniárias” na Internet.
A decisão da presidenta Dilma Rousseff de mandar publicar na Internet os salários, com todos os penduricalhos, dos ocupantes de cargos públicos no Executivo desencadeou ontem (17) uma reação dos sindicatos de servidores. Em seguida, o reforço pela resistência foi dado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). O impasse vai desembocar no Judiciário.
Com isso, a Lei de Acesso à Informação, criada com o objetivo de tornar a gestão pública mais transparente e eliminar as resistências à divulgação de dados oficiais, pode virar objeto de disputa entre Poderes.
Outros países que implantaram lei de acesso à informação passaram por situações semelhantes, observa o assessor de Comunicação e Informação da Unesco para o Mercosul e Chile, Guilherme Canela. “Essa discussão está posta e muitas democracias tem decidido pela publicação, sem grandes repercussões negativas para os funcionários individualmente e em geral com repercussões positivas para a sociedade como um tudo”, diz.
Servidores federais brasileiros ameaçam ir à Justiça contra a divulgação de salários, auxílios, ajudas de custo, jetons e “quaisquer vantagens pecuniárias,” de maneira individualizada, dos ocupantes de cargos públicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo, em sua edição desta sexta-feira (18), em matéria assinada pelo jornalista Rafael Moraes Moura.
Válido para o Executivo federal, o decreto publicado na quinta-feira no Diário Oficial da União deve constranger os Poderes Judiciário e Legislativo de todo País – e vai na contramão da postura do Senado Federal, que já decidiu que “os vencimentos dos funcionários são informação protegida”.
Em cerimônia realizada no Palácio do Planalto na última quarta-feira (16), a presidenta disse que a transparência funciona como inibidor eficiente de “todos os maus usos do dinheiro público”. Dilma pregou que “fiscalização, controle e avaliação são a base de uma ação pública ética e honesta”. O atual governo já perdeu sete ministros por conta de denúncias.
O caso dos salários não é novo no STF. O tribunal já tomou decisão a favor da publicação, em 2009, quando a Prefeitura de São Paulo decidiu divulgar a informação e foi alvo de processos judiciais por parte de servidores. O caso chegou ao Supremo após o TJ de São Paulo proibir a divulgação dos vencimentos. “Fui relator de uma decisão proferida aqui, sobre a cidade de São Paulo. Só excluí da publicação os endereços por uma questão de segurança”, disse ao Correio Braziliense o presidente do STF, Ayres Britto.
Frases
* Para o secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Josemilton Maurício da Costa, “a divulgação de salários expõe a intimidade do servidor”. Ele explica:“Transparência tem limite. O servidor já declara o seu imposto de renda, vai ter exposto o contracheque pra todo mundo ver? É no mínimo quebra de sigilo, é um desrespeito à intimidade do servidor e abre espaço para tudo que é mazela, sequestro relâmpago, má-fé”. (Costa não quis informar seu salário).
* Para o secretário-geral do Sindicato dos Servidores Públicos Federais no DF (Sindsep-DF), Oton Pereira, a divulgação individualizada é “invasão de privacidade”. Diz ele: “A presidenta Dilma tem de se preocupar é com quem pratica a dilapidação do patrimônio público e acumula rendas ilícitas. Hoje o governo Dilma virou balcão de negócios, esses servidores comissionados é que têm de ter sua renda exposta”. O secretário-geral disse que ganha mensalmente R$ 5.650 brutos.
* A Controladoria Geral da União afirmou, em nota, que “a informação sobre salário não é de caráter estritamente pessoal porque o salário é pago com recurso público e o cidadão que paga impostos tem o legítimo direito de saber sobre os salários pagos com os recursos que ele paga”.
* Roberto Gurgel, procurador-geral da República, disse que “o Ministério Público tem de ser um exemplo de transparência”.
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