População negra tem dificuldades no acesso pleno à saúde

Postado em 20 novembro 2019 10:05 por JEAcontece
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Processo histórico de racismo é responsável pelos desafios na inclusão, afirma psicólogo.

Hoje, 20 de novembro, é lembrado pela celebração do Dia Nacional da Consciência Negra. A data foi instituída oficialmente em âmbito nacional em 2011 e, além de ser marcado como um dia de reflexões e resgate da inserção da população negra no Brasil, é também coincidente com o aniversário de Zumbi dos Palmares – líder negro que lutou pela libertação do sistema escravagista.

No país, mais da metade da população (53,9%*) se declara de cor ou raça preta ou parda. Embora em números essa população configure uma maioria, a realidade social é de uma minoria que enfrenta desafios relativos à inclusão plena em sociedade, especialmente na saúde. Um exemplo desse cenário é a proporção de pessoas que consultaram um médico nos últimos 12 meses: enquanto que entre as pessoas brancas foi de 74,8%, entre as pretas e pardas foi de 69,5% e 67,8%, respectivamente.

Os percentuais também demonstram que as pessoas negras (pretas e pardas) ficam abaixo da média nacional de pessoas que consultaram um médico no período de um ano (71,2%). O problema do acesso à saúde entre a população negra também se reflete na maternidade: a proporção de mães negras que realizaram no mínimo seis consultas pré-natais – quantia recomendada pelo Ministério da Saúde – foi de 69,8%, ao passo que entre as mães brancas essa proporção foi de 84,9%.

Processo histórico
Em entrevista, o doutor em Psicologia Paulo César Ribeiro Martins atribui esse quadro a um processo que vem desde o século XVI. “Sou psicólogo e faço atendimento desde 1987, e acho que cheguei a atender no máximo uns cinco pacientes negros”, relembra Paulo. “O motivo que eu acredito que causa essa dificuldade de acesso não só à saúde, como à educação, etc. é um processo histórico”.

O psicólogo explica que os negros foram deixados de lado ainda no século XIX, ao serem proibidos de estudar mesmo após a abolição da escravatura. Povos de outros países, como Itália e Alemanha, chegavam ao Brasil e recebiam uma vaca, uma galinha, um pedaço de terra e um salário, mas os negros foram relegados à miséria e ao analfabetismo, realidade que permanece até hoje, desde os anos 1500. “A população do país é a maioria negra, mas existe uma estatística de que somente 7% dos doutores do Brasil são negros”, frisa.

O doutor aponta ainda que, dos 52% de brasileiros que não conseguiram concluir o Ensino Médio, a maioria destes são negros, contribuindo para uma marginalização que gera ignorância em relação aos cuidados com a saúde, resultando em uma menor procura de consultas e baixo conhecimento dos processos do corpo humano.

Acesso à educação é o caminho
Para Paulo, o governo brasileiro já se mobiliza em prol da mudança, e cita as cotas universitárias como um exemplo, porque proporcionam o ingresso dos negros nas Universidades. “Se você observar, por exemplo, as instituições de ensino superior de Passo Fundo, vai perceber que a maioria de quem frequenta é a população branca. Os negros não estão em sala de aula, docentes universitários negros é meia dúzia, então essa campanha para oportunidade de estudar, de ter informação, é o que futuramente vai desenvolver uma mobilidade social, pra que eles possam melhorar um pouco as suas condições de vida, pra poder então ter acesso à saúde”, reflete.

Perspectiva de mudança
“Vou te contar uma história”, inicia Paulo. “Eu comprei um carro novo e aí eu me esqueci dos documentos e um amigo me disse assim ‘volte e pegue os documentos, porque se a polícia te parar, a primeira coisa que vão dizer é que você roubou esse carro’, então existe também uma questão muito importante que é a conscientização de toda uma população contra o racismo”.

Apesar da situação não ser favorável, o psicólogo acredita que a mudança está sim em curso no Brasil. “Veja, nosso país está positivo a exemplo das partidas de futebol, quando tem manifestação de racismo, a população inteira já começa a se revoltar contra essa situação, então desse ponto de vista, acho que as coisas estão melhorando. Eu tenho uma perspectiva positiva”, afirma. “Uma coisa importante é que há algumas décadas os próprios negros não gostavam de outros negros e não gostavam de si mesmos. As meninas tinham vergonha dos cabelos, usavam chapinha, mas isso vem mudando. Um ator da rede Globo disse que quando era adolescente ele não gostava de si, enquanto negro. Era vergonhoso ser negro. Aí disse que quando ele começou a estudar, no nível superior, conheceu a história e começou a se orgulhar de ser negro. Então nesse sentido as coisas começam a melhorar, a partir do acesso dos negros à educação, que possibilita aumentar a sua autoestima e se orgulharem de serem negros”.

*Os dados percentuais deste parágrafo são do manual de 2017 da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, disponível no portal online do Ministério da Saúde.

Postado em 20 novembro 2019 10:05 por JEAcontece
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